MPT propõe ao Clube dos Caiçaras programa de aprendizagem e auxílio a famílias de boleiros
Medidas seriam forma de reparação pelos prejuízos causados com a exploração irregular de adolescentes que trabalhavam recolhendo bolas de tênis no Clube
O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) propôs, em audiência realizada na última quinta-feira (31/3), que o Clube dos Caiçaras inclua em programas de aprendizagem os jovens que trabalhavam de forma irregular como boleiros, atuando como aprendizes em atividades esportivas e administrativas. A proposta também inclui a prestação de auxílio a famílias em situação de extrema vulnerabilidade social, com prioridade àquelas dos adolescentes que atuavam no Clube.
Essa seria uma forma de garantir remuneração a essas famílias e capacitação profissional aos jovens, segundo a procuradora do Trabalho, Dulce Torzecki, representante no RJ da Coordenadoria de Combate ao Trabalho Infantil do MPT (Coordinfância). “Defendemos a inserção desses adolescentes com dignidade no mercado de trabalho. Precisamos descontruir o falso mito de que é melhor esses jovens estarem em qualquer tipo de trabalho do que na rua roubando. O certo é estarem na escola ou em alguma formação profissional”, afirmou a procuradora.
Na audiência, foi destacada a responsabilidade da sociedade na proteção aos direitos da criança e do adolescente, motivo pelo qual entidades com a envergadura do clube teriam ainda maior compromisso com causas de inserção social. O Clube dos Caiçaras responde a inquérito no MPT-RJ e foi autuado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTPS), no ano passado, após auditores fiscais flagrarem 26 adolescentes entre 14 e 15 anos trabalhando de forma irregular como boleiros de tênis, alguns em horário noturno, sem nenhum tipo de proteção ou controle de jornada (clique aqui para entender o caso). A Constituição brasileira proíbe o trabalho para menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14.
Na audiência, que contou também com representantes do Ministério Público Estadual (MPE), Ministério do Trabalho e Defensoria Pública, as autoridades propuseram que o Clube dos Caiçaras contrate como aprendizes os adolescentes que atuavam como boleiros irregularmente. Dessa forma, eles participariam de cursos de formação do programa Jovem Aprendiz no Desporto, oferecido por entidades autorizadas pelo MTPS e poderiam trabalhar como auxiliares administrativos do esporte ou na organização de eventos. Outra opção seria absorvê-los em funções de informática ou administrativa, também a partir da realização de cursos oferecidos gratuitamente pelo sistema S (Sesc/Senai/Senac).
“Dessa forma seria mantida a remuneração e eles teriam um aproveitamento profissional muito mais abrangente do que catar bolinhas”, frisou o coordenador do Projeto de Inserção do Aprendiz no Mercado de Trabalho do MTPS/RJ, Ramon Santos. Em complemento, o Clube destinaria recursos ao programa Apoio Social em Meio Aberto, da Prefeitura, que mapeia famílias em situação de vulnerabilidade e auxilia com recursos financeiros, apoio escolar e sociofamiliar, atividades esportivas, culturais e de lazer.
A ideia é que as famílias dos boleiros tenham prioridade no atendimento, podendo o auxílio também ser estendido a outras pessoas ou comunidades. “Se a intenção do Clube é manter um projeto de cunho social, essa proposta teria alcance mais amplo, pois previne que os vínculos familiares sejam rompidos, evitando ilícitos”, destacou o promotor da Infância e Juventude, Marcos Fagundes. Levantamento da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social demonstrou que alguns dos adolescentes explorados também eram responsáveis pelo sustento das famílias.
A procuradora do trabalho Danielle Cramer, também presente à audiência, explicou que essa situação de exploração irregular de adolescentes como boleiros em clubes de tênis do Rio de Janeiro já havia sido extinta há vários anos, após atuação do MPT-RJ e assinatura de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com as instituições. “Não podemos admitir que um adolescente seja o meio de sustento de toda uma família, substituindo a função de um adulto e sendo privado de desenvolvimento educacional”, destacou.
O MPT-RJ propôs ao Clube dos Caiçaras a assinatura de TAC, que traria essas medidas como alternativa ao pagamento de dano moral coletivo pelos prejuízos causados à sociedade com a exploração irregular de trabalho infantil. O termo traria, ainda, obrigações de não fazer, de forma que o Clube se comprometa a não mais utilizar mão de obra de adolescentes com menos de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, sob pena de pagamento de multa. “A ideia é evitar a judicialização e beneficiar as pessoas que precisam”, afirmou o procurador-chefe substituto do MPT-RJ, João Batista Berthier, durante a audiência.
O representante do Clube dos Caiçaras presente na audiência se comprometeu a levar as propostas para a diretoria da entidade. Nova audiência foi marcada para o dia 28 de abril. Caso o Clube não concorde em assinar TAC, o MPT, o MPE e a Defensoria Pública poderão entrar com ações na Justiça para requerer as verbas e indenizações.
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