Brasil deve receber 17 mil solicitações de refúgio este ano, estima Acnur

Parceria entre Cáritas e MPT-RJ vai contribuir com inserção desses estrangeiros no mercado de trabalho

Até o final de 2015, o Brasil deverá receber cerca de 17 mil solicitações de pessoas que desembarcam no país fugindo de perseguições políticas, religiosas ou étnicas sofridas em suas nações de origem. A estimativa é do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), com base em dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare). Segundo o órgão, o número de solicitações de refúgio no Brasil saltou de 566 em 2010 para 12 mil no ano passado, e a tendência é de que esses números continuem a crescer, impondo desafios para as autoridades locais, sobretudo, quanto à inserção dessas pessoas no mercado de trabalho.

“O número de refugiados no mundo está aumentando e já ultrapassou a quantidade de deslocados na Segunda Guerra Mundial”, destacou Andrés Ramires, representante do Acnur no Brasil. Ele participou do Seminário Trabalho e os Direitos dos Refugiados no Brasil, promovido pelo Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) e a Cáritas/RJ, nesta segunda-feira (15/6). O seminário reuniu diversas autoridades, no intuito de debater formas de garantir a inserção de refugiados e solicitantes de refúgio no mercado de trabalho brasileiro. Para o cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani Tempesta, o fenômeno gera consequências sociais, políticas, econômicas e religiosas. "A questão dos refugiados se agravou no nosso tempo dando origem a uma crise humanitária em várias regiões do mundo, provocando ondas de terror e violência. Por isso, representa um grande desafio à comunidade nacional e internacional", destacou.

De acordo com a procuradora-chefe do MPT-RJ, Teresa Basteiro, o objetivo do evento é chamar atenção para o tema em busca de soluções para garantir o cumprimento da legislação brasileira e internacional, que garante aos refugiados o direito ao trabalho digno nos países em que são acolhidos. “A integração dos refugiados na sociedade passa pela sua inserção no mercado de trabalho. Precisamos garantir a eles a aprendizagem do idioma e a capacitação profissional, para que eles possam realizar um trabalho e manter suas famílias”, destacou a procuradora do trabalho.

De acordo com Ramires, hoje as principais barreiras que dificultam a entrada de refugiados no mercado de trabalho são o idioma e a emissão da carteira de trabalho. No Brasil há cerca de sete anos, Charly Kongo, de 34 anos e natural da República Democrática do Congo, conta que a dificuldade de falar e entender o português, além da burocracia para validar seu diploma de enfermagem, foram os principais fatores que dificultaram sua entrada no mercado de trabalho brasileiro. “Tive que mudar de setor e começar a trabalhar com hotelaria, pois revalidar os diplomas leva muito tempo e precisava de algo para sobreviver”, conta.

Além dessas barreiras, o Diretor Executivo da Cáritas/RJ, Cândido Feliciano, explica que os refugiados ainda costumam enfrentar preconceito na hora de serem contratados, pois muitas pessoas acham que, por estarem nessa condição, eles fizeram algo de errado ou vão fazer algum tipo de subversão na empresa. “Muitos veem os africanos como pessoas analfabetas, sem cultura, os árabes como terroristas e colombianos como traficantes. Ficamos sempre com as funções mais duras, pois acham que não temos inteligência ou formação, mesmo com currículos melhores”, complementa Charly Kongo.

Também da República Democrática do Congo, Mireille Muluila, 37 anos, afirma que entre as mulheres as dificuldades de se conseguir emprego são ainda maiores. “Muitas mulheres chegam aqui sozinhas com filhos, pois tiveram seus maridos mortos ou sequestrados na guerra, ou ainda foram vítimas de violência sexual”, explica. Segundo ela, muitos empregadores acabam priorizando contratar homens para trabalhos mais pesados. Segundo a Cáritas/RJ, cerca de 70% dos homens atendidos pela entidade estão trabalhando, enquanto entre as mulheres o índice é de 50%.

O acesso a postos de trabalho de gerência ou que exigem formação de nível superior é outro desafio para os estrangeiros que vivem no Brasil, não apenas para refugiados. De acordo com pesquisa feita pela Pastoral do Migrante e a Rede Migração do Rio, com dados do Censo 2010 do IBGE, no Rio de Janeiro, dos cerca de 30 mil imigrantes que trabalham, 40%exercem atividades elementares como operadores de máquinas, vendedores, montadores, etc.

De acordo com a procuradora do trabalho no Paraná Cristiane Lopes, a legislação brasileira e internacional garante ao refugiado acesso pleno a todos os direitos dos brasileiros, salvo o político (de votar e ser votado). É esse o principal ponto que diferencia o refugiado ou solicitante de refúgio do imigrante convencional. A Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto do Refugiado, ratificada por 147 países, entre os quais o Brasil, cria obrigações para que os governos permitam a essas pessoas trabalho legal e seguro. A Lei 9.474/97 também garante a emissão de carteira de trabalho para os solicitantes de refúgio no Brasil.

Projetos - Na tentativa de contribuir com a inserção dos refugiados no mercado de trabalho, o MPT-RJ firmou com a Cáritas/RJ protocolo de intenções que possibilita a destinação de recursos oriundos de multas e indenizações trabalhistas a projetos voltados aos refugiados. Como parte dessa parceria, o MPT-RJ destinou R$ 300 mil de multa trabalhista para a realização de curso de português oferecido pela Cáritas a refugiados no Rio de Janeiro. Além disso, outros R$ 6 mil foram destinados à impressão da Cartilha do Trabalhador Refugiado e Solicitante de Refúgio.

A cartilha, que está sendo produzida pela Cáritas/RJ, vai oferecer aos refugiados, em uma linguagem simples e acessível, informações sobre a legislação trabalhista brasileira, assim como orientações para ingressar no mercado de trabalho. Segundo Natália Cintra, advogada voluntária da Cáritas/RJ, a publicação trata dos temas mais demandados pelos refugiados à entidade. “Pretendemos esclarecer as dúvidas mais recorrentes deles, com orientações sobre como elaborar um currículo ou se comportar em uma entrevista de emprego “, explica. A cartilha também explica aos estrangeiros questões jurídicas relacionadas a descontos salariais, rescisão contratual e demissão com ou sem justa causa, além dos direitos e deveres dos trabalhadores no país. 

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Tags: refugiados, cáritas, refúgio, Acnur

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